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uma tardinha, se não fosse boca de
noite já, apareceram uns homens na rua, vindos não sei de onde, e se alojaram
numa construção, para passarem a noite. Carregavam mala e cuia, ao que pareceu
estarem em viagem. Parece que o dono da construção permitiu a estadia deles
ali. Os homens, tendo visto duas bonitas melancias, no terreno de um dos
moradores da rua, rapidamente se encantaram, e, com água na boca,
encaminharam-se ao dono das melancias, a pedir as frutas.
Pediram, aos demais
moradores, outras coisas mais: um quilinho de arroz a uma senhora, um pouco de
sal a outra, um isqueiro para acender o fogo provisório, uma lamparina velha,
no baú de alguma anfitriã. Quase ninguém negou-lhes nenhum pedido, ou porque,
nessas bandas não é da cultura do povo negar pouca coisa a quem quer que seja,
ou porque gente estranha costuma causar certo medo.
Entretanto, receberam
negativa do dono das melancias. Quando foram pedi-las, sobrepujou-se à mente
deles uma decepção ante a resposta que obtiveram:
- Estão verdes – disse
o dono.
Na manhã seguinte,
quando acordou e foi ver a cor do dia, percebeu o senhorzinho que as melancias
rechonchudas haviam desaparecido. Perto dali, os homens alojados na construção
também havia sumido.
Ao saber disso,
comentei lá em casa. E tudo o que fizemos foi rir. Porque, de fato, fora
engraçado (que o proprietário das melancias não saiba). E, ao comentar, uma
pessoa disse que os homens fizeram a parte deles, ao pedirem. E quase ninguém,
para não dizer ninguém, acusou ou indivíduos de terem praticado roubo.
Lembrei-me, ao saber
do ocorrido, da fábula “A raposa e as uvas”, do Esopo, em que uma raposa, ao
avistar um belo cacho de uvas numa videira alta, justifica sua preguiça ou sua
incapacidade de pegar as frutas, ao dizer para si mesma: “estão verdes”. Quando
contei essa estória, ouvi grandes gargalhadas. E nem sei se pode existir
conexão entre a fábula da vida real e a de Esopo.
Nesta última vemos
como, em determinados momentos, procuramos amenizar o peso da nossa incapacidade
de realizar algo. Naquela, há uma questão moral presente. De um lado, da parte
de quem justifica sua má vontade em oferecer a melancia. De outro lado, daquele
quem justifica um furto: roubou porque o homem não deu.
Mas e se as melancias
estivessem verdes mesmo? Não sei. Pensem, pois, os moralistas! O que sei mesmo
é que quem tiver, no seu quintalzinho, uma melancia, ou um jerimum, não dê mole,
esconda bem escondido. Porque na calada da noite pode aparecer um esperto para
conferir se está verde mesmo.
29 de Abril de 2018
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