Enquanto passamos pelas
estradas apertadas do Pé da Serra, em Via Sacra, no dia da Paixão de Cristo,
vou relembrando cenas de um passado distante, vivido naquele lugar, que
marcaram minha juventude e a de muitas outras pessoas.
A começar pelo açude, antes
chamado por todos Açude da Emergência, de propriedade da família de seu
Raimundo Maximino. Nas cheias do açude, juntava muita gente para tomar banho,
porque quando sangrava era permitido. Desenhava-se uma paisagem encantadora a nossos
olhos.
Daquele açude, em menino,
carreguei muita água para a luta de casa. Ali também as mulheres da cidade
lavaram a roupa da semana. Pouca gente não se servia daquela água. Pouco jovem,
ali da redondeza, não “roubou” manga para comer com sal. Porque fartos pés de
manga enraizavam-se naquele solo fértil. Naquela água semiamarelada pescávamos
peixinhos para comer com farinha. Eram magros os peixes, mas a aventura da
pescaria era boa para a meninada.
No Pé da Serra, em direção ao
Morro da Cruz, há a estradinha apertada, toda em areia grossa e pedras.
Estradinha que nossos pés cruzaram (e ainda cruzam) tantas vezes para subir o
morro, ver as cheias dos açudes e ir aos umbuzais. Ao lado da estradinha, solos
de pedra guardam a fertilidade. Por ali a água das chuvas corriam tranquilas,
lavando nossos pés, desembocando no açude da Emergência.
Naquelas matas adentramos
muitas vezes em busca dos umbus maduros, percorrendo as veredas. Também chamavam
a atenção os pés de umburana e aroeira, cuja casca é medicinal.
Espécies próprias da caatinga
jazem ali, no Pé da Serra. Pedras monstruosas, moldadas pela ação tempo e pela
natureza posam naquele lugar. Pedras de uma aspereza peculiar, de uma beleza
rara, que nos fascinam. Já foram objeto de mitos, povoando nossa imaginação.
Quando a Igreja Católica, na
Campanha da Fraternidade, celebra a consciência ambiental e a valorização da
biodiversidade, penso que o Pé da Serra verdadeiramente precisa ser um lugar
sagrado, com tudo que há nele. Não só o nosso São Francisco de pedra que jaze
no topo do Morro da Cruz, mas também suas árvores, seus animais, suas pedras,
suas águas, suas estradas, seus frutos...
Preservar esse lugar é nosso
dever como humanos, como cristãos e como cidadãos salitrenses. O Pé da Serra
guarda muito de nossa origem. Tudo que nele existe é, além de tudo, uma
manifestação da presença de Deus.
14 de Abril de 2017
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