O fato mais triste que me
aconteceu esta semana, não tem dois dias, foi um anúncio de morte por uma voz
murmurante. Não foi morte de gente, não. Foi morte de cachorro. Um cachorro
nunca visto por mim – ainda bem.
Eu ia saindo de moto fazer a
compra do pão, mal nascera o dia. E de repente apressou o passo uma velhinha,
minha vizinha, que quase não fala nada. Mas veio correndo para me dizer tudo
isso:
--- Como é que pode, hem? Vou
embora daqui, não aguento... O povo pega e enterra um cachorro logo na frente da casa dos outros – e dizia-me com um pingo de voz.
E chorava. Chorava de verdade.
Eu não quis chorar também. Mas fiquei sentido. Fiquei muito sentido. Eu juro!
Eu disse, numa meia voz, que concordava com ela, que os vizinhos erraram ao enterrar
cachorro ali. Porém, na realidade eu nem sabia o que pensar. Pareço não saber
ainda. E nem quero dizer nada. Porque tocou-me mais a dor da senhora, a sua
angústia em seu murmurar.
Não que não eu tenha dó do
cachorrinho. Não também que não me apavore saber que ao lado da minha casa tem
um cão enterrado. É de benzer-se. Deixar o bichinho acabar-se ao sol, na boca
dos urubus, é mais humano. Cão enterrado?
Não combina.
Eu soube de outros casos
assim, em que se enterravam animais brutos, como costumam dizer. Casos piores,
em que se mata um cão só por ele ser bom de galinha. Nos sítios, quando um
cachorro comete um grande crime, dão-lhe uma surra de arrepiar a gente. Ainda mais
um cachorrinho morto, o que não vão fazer? A intenção não tem maldades,
entretanto, saber que bem perto enrolaram o cachorro incomoda um pouco.
E a imagem da senhora, atônita
por me denunciar aquela malvadeza, desestrutura-me. Piedade natural? Decerto. Eu
não sei explicar porque isso tem tanta força sobre mim. Nem preciso. Tem coisas
que explicadas perdem o sentido.
5/1/2017
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